quarta-feira, 6 de junho de 2012

Só um começo


São minhas primeiras horas sozinha com o Gabi, não me sinto mãe, e não consigo descrever como é isso, mistura-se aflição e um pequeno desespero, somado a inexperiência e a sensação de que ele não está bem comigo. Não consigo que ele mame e nem que respire, me agonia a necessidade gritante de máquinas. E quando resmunga é como se gritasse por socorro ou me pedisse que que fosse embora e o deixasse com alguém que ele ame.

Hoje ao acordar o céu parecia mais azul, me recordo de ter visto esse céu apenas uma vez, o ar parecia mais leve e puro, a água era doce, encarei como sintomas de felicidade.

Meu bebê não chora, ele acorda, é alimentado e logo volta a dormir, as vezes grita, de dor, e a impotência que possuo perante a situação é desesperadora. Tenho medo de dormir, medo de acordar e ele não mais respirar, medo que ele sinta dor, medo de machucar, medo, medo, medo, e medo.

Já carreguei algumas cruzes, se não suportasse o peso tudo bem, eram minhas, agora carrego a dele e sou responsável por ela, não me sinto preparada para cuidá-lo, sou incompetente e desorganizada, e acredito que também não esteja pronto para ficar ao meu lado. Ao contrário do esperado, tenho mais agonia do que qualquer outro sentimento, eu esperava um dia claro com balões e flores, palhaços e pôneis, aonde estão os pôneis?

Nesses três meses de uti vi e ouvi muitas coisas, conheci bebês que apenas recebem um banho de luz e vão embora, a bebês anencéfalos e hidrocefálicos que ganham alta, percebi que nem sempre a grama do vizinho é a mais verde, e que nas horas de necessidade nos apoiamos nas mais distintas e inesperadas coisas, e acho que aprendi a ser forte, conheci a intensidade dos sentimentos, desespero, medo, compaixão, pena, raiva, solidariedade, indiferença e a felicidade, principalmente felicidade... Vi pessoas tão altruístas, com uma tamanha ternura que relatar é difícil. Eu conheci vida e morte, vi lutas e vitórias de pequenos pequeninos, e um gigante não teria tanta força para continuar. Não consigo descrever essa fina linha entre viver e morrer, a única sensação são picos, picos de vida e picos de morte, e cada pequeno instante é uma vitória.


Nenhum comentário:

Postar um comentário